Reescrita

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Reescrita é um conceito desenvolvido por André Lefevere (Bélgica, 1945 - EUA, 1996) em seu livro Translation, Rewriting and the Manipulation of Literary Fame, de 1992. Segundo Lefevere, a tradução é uma das principais formas de reescrita de um texto anterior, ao lado de resenhas, resumos, críticas, adaptações, antologias, etc.

A partir da teoria dos polissistemas, de Itamar Even-Zohar (Tel Aviv, 1939), que considera a literatura traduzida como um subsistema do sistema literário geral, a tradução é vista como uma reescrita produzida e lida segundo uma grande variedade de determinantes ideológicos e políticos, de natureza objetiva, assim como subjetiva.

A noção de reescrita de Lefevere inclui a ideia de que não existe um original no sentido clássico de uma criação individual, pois toda obra resulta de leituras e impressões anteriores. Para ele, a ideia de um gênio individual, ou da possibilidade de se conhecer a intenção do autor, são heranças das visões do romantismo sobre a criação artística. Dentro dessa visão, o trabalho do tradutor é mais uma versão das ideias que perpassam o texto de partida.

Assim como o autor do texto de partida, o tradutor está igualmente sujeito a uma série de fatores que determinam a sua escritura. Num primeiro nível, esses fatores são intrassistêmicos: a linguagem, o universo do discurso e a poética. Além desses, existe a ação de forças regulatórias intrínsecas ao sistema literário, manifestas na ação dos profissionais diretamente sobre a criação da reescrita. São os tradutores, resenhistas, escritores, etc. Num terceiro nível está a ação de elementos externos ao sistema literário, que constituem a patronagem, categoria que inclui editores, governos, agentes, etc.

Dentro da categoria linguagem, vista como fator intrassistêmico, Lefevere destaca as diferenças entre texto de partida e de chegada e os variados tipos de movimentos linguísticos ditados por critérios estéticos e ideológicos dominantes em cada período. O universo do discurso refere-se ao "conhecimento, educação e também aos objetos e costumes de uma dada época". A poética constitui-se de dois componentes: um inventário, que reúne o repertório de gêneros, dispositivos literários, motivos, determinados símbolos e personagens e situações prototípicos; e funcional, que caracteriza de que forma a literatura deve ou pode funcionar dentro da sociedade.

Lefevere denomina profissionais os indivíduos que elaboram os critérios estéticos, controlam o sistema literário e filtram o que entra e o que sai do sistema. Essas pessoas podem se organizar em entidades, como academias, a partir das quais pretendem normatizar e regular a atividade literária.

Dentro do conceito de reescrita, a patronagem é a categoria que reúne os elementos de poder externo, que interferem sobre os demais níveis. Podem ser indivíduos ou instituições e, predominantemente, estão mais voltados para os aspectos ideológicos em jogo no sistema literário do que com a poética. A patronagem atua a partir de três bases, ideológica, econômica e o status. O componente ideológico, nos termos de Lefevere, é a visão de mundo que orienta a ação das pessoas e constitui um determinado, e difuso, quadro mental. O elemento econômico é aquele utilizado pelos patronos para controlar a subsistência de autores e reescritores através de algum tipo de remuneração. O status é aquela condição segundo a qual os profissionais são classificados socialmente segundo sua aceitação ou não em determinado grupo social. Esse stauts pode ser o diferencial entre um autor/reescritor ser ou não incluído no cânone literário de um determinado período.